«Arrastamos os dias como podemos e sabemos. Às vezes encarrilamos em tarefas que, de algum modo, nos divertem; outras vezes sentimos desafios e entusiasmos; por vezes ficamos entristecidos, zangados e infelizes: mas genericamente, distraímo-nos com pequenos acontecimentos e afazeres que esquecemos mal terminam e parecem não deixar qualquer lastro.
Os dias correm com alguma monotonia, ainda que os mais hábeis aprendam a dosear as quantidades certas da rotina que os tranquiliza e da novidade os desperta e inquieta.
Excepcionalmente, muito excepcionalmente, alguns mergulham em estado de graça.
Vinda de um confim qualquer, indizível e misterioso, chega à consciência uma espécie de energia transformadora que faz a diferença. Porque tal acontece, tudo o que nos rodeia ganha uma nova e diferente profundidade e nitidez.
Alguns associam este estado de graça a acontecimentos específicos como uma paixão amorosa, uma gravidez muito desejada ou uma situação capaz de introduzir ruptura com os sentidos habituais. Outros sabem que o estado de graça pode acontecer apenas porque sim, eventualmente para nos fazer sentir que viver pode ser, além de um facto da natureza, uma dádiva única que há que celebrar.»
Isabel Leal
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